Como ensinar habilidades escolares aos nossos alunos? Em primeiro lugar, precisamos lembrar que o papel do professor é o de propiciar a aprendizagem, lembrando que esta envolve mudanças no comportamento. Portanto, a tarefa do professor é mudar comportamentos. Em segundo lugar, um dos aspectos importantes para o ensino de novos comportamentos (habilidades acadêmicas) é a definição de objetivos específicos (o que a criança ou adolescente tem que fazer), então, uma das perguntas que o professor deve se fazer é “quais comportamentos são pré-requisitos para meus alunos estarem em sala de aula?”.
Algumas das habilidades necessárias são:
Manter-se sentado por pelo menos 15 minutos;
Responder ao chamado do nome (olhar para a pessoa que está solicitando sua atenção);
Compreender instruções verbais simples de maneira direta e indireta. Direta, a instrução é dada especificamente para o aluno; Indireta, a instrução é dada para o grupo. Por exemplo: senta, guarda, me dá, vem cá, levanta, pega, espera sua vez;
Comunicação vocal ou por figura para o uso do banheiro e beber água;
Imitar ações;
Identificar figuras;
Parear figuras (juntar figuras iguais e semelhantes).
As próximas perguntas que o professor deve se fazer são: “o que quero que meus alunos sejam capazes de fazer?” “o que meus alunos já deveriam saber para o aprendizado de um novo conteúdo?”
Após refletir sobre o que os alunos devem aprender, o professor poderá utilizar-se de algumas estratégias para tornar esse processo mais divertido e agradável para o aluno. Estamos falando aqui de três adaptações simples e que podem minimizar muito as suas dificuldades acadêmicas em sala de aula.
A primeira delas diz respeito à forma do professor se dirigir ao aluno para solicitar tarefas e instruí-lo. A criança com TEA apresenta dificuldades na comunicação verbal e não verbal, tornando-se necessário o emprego de frases simples e diretas para facilitar o seu entendimento.
O uso de instruções verbais em excesso e de figuras de linguagem, como as metáforas ou ironias, tornam a recepção da informação pouco clara. Vale observar, também, que o professor pode se valer de uma entonação e volume de voz mais acentuados para facilitar o contato, sempre, é claro, pedindo o contato visual e se abaixando na altura em que a criança está para facilitar a interação.
A segunda forma diz respeito a ensinar o conteúdo previsto em pequenos passos e de forma mais direta. A adaptação do material de ensino nem sempre precisa ser complicada e pode ajudar muito o aluno. Muitas informações na mesma folha, instruções longas e pedidos variados no mesmo exercício tendem a confundir essa criança e devem ser evitados, sempre que possível.
Finalmente, não podemos deixar de falar de uma estratégia que pode diminuir a ocorrência de comportamentos tais como comportamentos agressivos, acessos de birra e apatia, bem como, evitar que crianças com TEA aprendam uma habilidade de forma incorreta e tenham que ser ensinadas novamente. A análise do comportamento denomina essa estratégia de aprendizagem sem erro. O professor pensa no que quer ensinar. Avalia o que o aluno sabe e, a partir disso, programa o repertório almejado, sem que o aluno passe por um processo de aprendizagem por tentativa e erro. Se o professor planeja a sequência gradativa de ensino, evitará o erro, promovendo uma aprendizagem de sucesso.
Evite excesso de estímulos visuais nas paredes. No geral, o professor gosta de enfeitar a sala de aula, no entanto é bom direcionarmos as ilustrações para a matéria estudada no momento.
Observe a posição do aluno na sala de aula. Minha sugestão é que o aluno com TEA fique na fileira da frente, com um dos lados da carteira encostado na parede e o outro lado com espaço suficiente para que a auxiliar (acompanhante quando houver) possa sentar.
Minimize o barulho, mantendo-se a rotina de classe com comando expressivo de voz do professor (sem gritar, naturalmente!).
Combine com as crianças o sistema de saída para banheiro ou água. É bom que as crianças saiam uma por vez, após pedirem autorização verbal ou por figuras (no caso de crianças não verbais). Sugiro que as crianças com TEA estejam acompanhadas ao sair da classe.
Use rotinas visuais para que o aluno possa antecipar o que vai acontecer. Essa estratégia minimiza a ocorrência de comportamentos inadequados. Alunos com TEA tem necessidade de rotina e não suportam improvisos ou alterações repentinas na rotina.
O aluno com autismo pode não ser expert na empatia e na reciprocidade com o outro, mas algumas habilidades podem ser ensinadas. Por exemplo: em situações em que a criança pega o brinquedo do colega, a professora pode dizer que o colega não gostou deste comportamento e sentiu-se muito triste: “Olha para seu amigo. Ele está bravo ou feliz? Ele gostou do que você fez?” Nesse momento a professora pode ajudá-lo a compreender o contexto, reconhecer a emoção do colega e mostrar como pode ser resolvida a situação (“agora você devolve o brinquedo e pede desculpas”).
O momento do intervalo pode ser muito difícil. Algumas crianças com TEA podem ficar andando aleatoriamente, dando pulinhos, gritando, balançando as mãos, correndo sem rumo, apresentando estereotipias ou tentando pegar o lanche das crianças, por exemplo. O que podemos fazer nessas situações? A sugestão é que professores ou auxiliares promovam constantemente uma mediação positiva, isto é, o adulto fica próximo da criança antecipando a ocorrência dos comportamentos inadequados (por exemplo, pegar o lanche do outro) e direcionar a função aos comportamentos apresentados (ex: a criança gosta de correr, devemos inventar um pega-pega e correr de mão dada com a criança).
É importante lembrar também que as brincadeiras procuram desempenhar funções cruciais na vida da criança. As atividades agem no desenvolvimento das habilidades cognitivas, sensoriais, motoras, emocional e social, a partir do momento em que ela é colocada em situações lúdicas e que só tendem a aprimorar suas faculdades mentais, dentro do espectro autista.
Dicas pedagógicas que ajudarão os professores no trabalho inclusivo dos seus alunos com autismo:
Planejamento prévio das atividades para adaptar ou preparar algo diferenciado de preferência com o mesmo tema abordado com os demais. Levar sempre em consideração a condição cognitiva de seu aluno;
Utilizar-se de apoio visual. As imagens podem ser utilizadas na elaboração da rotina, na fragmentação de atividades e na comunicação das crianças não verbais. Veja onde elas poderão ajudar seu aluno e utilize-as;
Reduzir os estímulos da folha. Muita informação em uma folha pode fazer com que a criança desanime frente a grande demanda ou simplesmente fixe sua atenção em outros elementos não relevantes;
Fala direta, objetiva e positiva. Se a instrução for grande, fragmentá-la em partes menores favorecerá a compreensão (Você quer brincar de massinha? Então faça essa atividade e brinque depois de massinha!);
Escolher o lugar fixo da criança com atenção e cuidado. Próximo ao professor, longe de janelas e portas;
Reforçar toda ação positiva e adequada da criança, seja disponibilizando um item reforçador ou elogiando;
Dilação de tempo, ou seja, possibilitar mais tempo para a conclusão de provas e atividades.
Família e Escola
A falta de informação é fator citado, frequentemente, como um gerador de conflitos entre pais e professores. A criança ou adolescente com autismo pode não conseguir expressar em palavras os eventos do dia e o porquê de seus atos. Esses dados, por exemplo, ressaltam que formas de compartilhar informação de casa e a escola serão necessárias.
Sugestões de como estabelecer uma boa comunicação entre pais e professores: Reuniões regulares sobre os objetivos educacionais (por exemplo, três vezes ao ano) para que, tanto aspectos rotineiros, quanto mais específicos (manejo de desobediência, estereotipia, rigidez e dificuldade de relacionamento com os colegas) sejam gerenciados em casa e na escola; Implementação, por exemplo, de um diário de comunicação entre professores e pais, com o objetivo de informar alterações domésticas, tais como, de sono, medicação e alimentação e, ainda, fornecer informação da escola para casa, como a presença de professor substituto, mudança de rotina, necessidade de enviar mais fraldas etc.
É importante que os professores respeitem a escolha da família de tornar público ou não um diagnóstico, a utilização de medicação e a participação em terapias. Isso ajudará o professor a desenvolver o laço de confiança com a família e vice-versa. A confiança é o ponto principal no trabalho e no desenvolvimento de qualquer aluno.
Não há nada mais frustrante para o professor e angustiante para os pais do que se defrontar com a situação de algumas crianças que não aprendem a ler, a escrever, a calcular e realizar demais atividades no mesmo ritmo que outras, não correspondem ao esperado para a idade, choram, se isolam e não socializam. Por outro lado, não há nada mais estressante que lidar com o filho ou o aluno que é constantemente desafiador, não respeita regras e limites, tem respostas sempre na ponta da língua e principalmente vive corrigindo suas falas e suas ações, além de nunca levar desaforo pra casa, porque parece que está sempre preparado para uma briga.
Ambas as situações, podem acontecer com crianças e adolescentes autistas. Cada uma de uma forma, em níveis de suporte diferenciados. Por este motivo, no parágrafo único do artigo 3º da Lei 12.764 de 27/12/2012 diz: “em casos de comprovada necessidade, a pessoa com transtorno do espectro autista incluída nas classes comuns de ensino regular, nos termos do inciso IV do art. 2o, terá direito a acompanhante especializado.”
Isso quer dizer que além do professor regular ou dos professores regulares, o autista, comprovada a necessidade, terá direito à um profissional que trabalhará dentro da sala de aula e demais ambientes da escola, esse profissional é chamado de tutor, acompanhante terapêutico ou professor auxiliar. E este profissional deverá minimizar as dificuldades de aprendizagem ou de comportamento.
Plano Educacional Individualizado
O Plano Educacional Individualizado, mais conhecido pela sigla PEI, é um documento elaborado pelo professor do aluno (ou professores quando este tiver mais de um) a partir de uma avaliação de um aluno com necessidade educacional específica. Essa avaliação será feita pelo professor com a colaboração do acompanhante especializado (contemplado no art. 03, da lei 12.764/12) para levantamento de necessidades, comportamento, conhecimentos prévios, potencialidades e habilidades de alunos com deficiências, com transtornos globais de desenvolvimento, transtorno do espectro autista, com altas habilidades ou superdotação ou com dificuldades de aprendizagem.
Cada aluno é único, cada um aprende e se comporta de uma maneira, portanto, o PEI visa registrar esse caráter individual de cada aluno para que, usando estratégias adequadas, ele possa aprender e se comportar de forma a promover seu desenvolvimento integral, assim como os outros estudantes, no ensino regular.
Conforme a Instrução Federal normativa PRE/IFSP nº 001, de 20 de março de 2017, o PEI é composto de informações gerais sobre o estudante e sua vida escolar, por isso, precisa ser aprovado pelo estudante ou pelo responsável no caso de estudante menor de idade e deve ser revisado periodicamente, a fim de que o professor possa acompanhar o desenvolvimento do aluno e mudar as estratégias conforme observação em sala de aula e no convívio desse aluno com a comunidade escolar.
Para a construção do PEI podemos utilizar 5 passos:
1. Conhecer o Aluno: Conhecer sua história, seus gostos, seus conhecimentos já adquiridos, seu comportamento e o que ele precisa aprender, suas habilidades e necessidades.
2. Estabelecer Metas: Neste item, você deve definir as metas de curto, médio e longo prazo. Avaliar o que a criança deve aprender em cada espaço de tempo a partir do seu perfil.
3. Elaboração do Cronograma: Com as metas traçadas, você precisa definir como e quando elas serão executadas. Lembrando, que a acriança pode ter dificuldades de assimilação e acomodação dos conteúdos, ter paciência e dar um tempo maior para que termine suas atividades e avaliações e fundamental.
4. Estratégias de Adaptação: Pense no que faz sentido para o seu aluno, dentro da realidade dele. Adaptação na rotina quanto ao tempo, espaço, sequência de atividades do dia; Adaptação no conteúdo quanto atividades com elementos concretos, cantigas, cartazes, comunicação; Adaptação no ambiente em relação ao mobiliário, iluminação, tecnologia assistiva; Adaptação das atividades no caderno, na folha, na apostila e no livro de acordo sua maturidade cognitiva.
5. Avaliação: Você precisa realizar o Registro Avaliativo do aluno organizando os procedimentos e avaliando as metas alcançadas. Lembre-se que a avaliação não precisa ser necessariamente da mesma forma que os demais alunos. O aluno com deficiência ou autista pode realizar avaliações diferenciadas, sendo que a melhor forma de o avaliar é diariamente, conforme seu desempenho e sua evolução.
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Se usar cite a referência:
SOUZA NEVES, Regiane. Transtorno do Espectro Autista: Conhecer, Diagnosticar, Intervir e Orientar. Souza & Neves Edições. Clube de Autores. 3ª edição. São Paulo, 2023 (ISBN: 978-65-5392-356-0)