O governo brasileiro sancionou uma lei declarando Paulo Freire (1921-1997) patrono da educação brasileira. Sua contribuição ao tema é vasta, da mesma forma que o alcance de sua influência, presente nos mais diversos campos do conhecimento. Ele acreditava que a educação deveria ser um instrumento libertador, um meio pelo qual o aluno pudesse conquistar autonomia e se tornar um ser consciente. Para tornar isso possível, ele defendeu um modelo de ensino baseado na prática dialética.
Como resultado, em sala de aula, alunos e professores mantêm um intercâmbio intenso. Os estudantes aprendem com os mestres, e vice-versa. Todos podem se expressar, pois essa condição é entendida como fundamental para a construção da confiança. “A teoria do conhecimento de Paulo Freire reconhece que os atos de conhecer e de pensar estão diretamente ligados à relação com o outro. O conhecimento precisa de expressão e de comunicação”, diz Ângela Antunes, diretora de gestão do conhecimento do Instituto Paulo Freire.
Os educadores também estimulam o interesse pelo saber, oferecendo meios para os jovens realizarem suas próprias descobertas e desenvolverem o autodidatismo, como explica Maria de Lourdes Leite Rocha e Silva integrante da equipe pedagógica de uma escola localizada em Pernambuco, a terra natal de Freire.
Alfabetização Outra diferença está no conteúdo, que incorpora aspectos da realidade. No método de alfabetização que desenvolveu (inicialmente para adultos), os professores iniciam o percurso identificando e catalogando as palavras que fazem parte do universo dos aprendizes, as chamadas ‘palavras-geradoras’.
Cada uma delas é estudada por meio da divisão silábica, semelhante ao que ocorre no ensino tradicional, e só depois de dominada essa etapa são ensinados novos vocábulos. A tomada de consciência acontece com a compreensão do mundo pela criança, um processo conduzido com a discussão e a problematização de temas que também são familiares a elas. “A escola e os educadores têm clareza de que o conhecimento não é neutro, que ele possui uma função social, e, na perspectiva freiriana, busca-se construir um conhecimento que seja emancipador, que contribua para a humanização, impregnando de sentido a vida”, explica Ângela.
Para criar uma ponte entre o currículo escolar e o contexto do educando, o professor precisa continuamente renovar seu arsenal de intervenções pedagógicas. Maria de Lourdes enxerga essa exigência como algo positivo. “O educador não se sente engessado em suas ações, pois, a partir da análise da realidade, pode criar continuamente novas possibilidades de aprendizagem”, afirma. A educadora ainda acrescenta que na instituição onde trabalha são feitas diversas atividades com a participação da comunidade.
O objetivo é estimular a responsabilidade social e também aumentar as ocasiões de ensino fora da sala de aula, algo que Paulo Freire defendia e chamava de educação popular. Por isso, nesta escola, as avaliações consideram os conteúdos disciplinares e também o que foi aprendido com a família, na internet, por meio de revistas, livros, filmes e outras mídias. Valores humanos Os princípios éticos também são importantes na pedagogia freiriana. Assim, a tolerância, o respeito e a humildade são valores permanentemente trabalhados de forma direta ou indireta.
O conjunto dessas medidas, que não excluem o cumprimento dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), naturalmente, tampouco a busca por bons resultados em avaliações como Prova Brasil e o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb), promovem gradativamente a construção da liberdade responsável e da participação, como defende a professora. “É por essas características que hoje, no Brasil, nenhum modelo de educação é possível sem a rica orientação daquele que se tornou patrono da educação brasileira”, conclui Maria de Lourdes. Para Ângela, do Instituto Paulo Freire, o legado vai além: “É um legado de esperança, de entender a educação como espaço de transformação social, que nos ajuda não só a ler a história, mas sermos também escritores da história”, complementa.
PROFESSOR: considera que o aprendizado ocorre de forma conjunta. Valoriza o diálogo, estimula o interesse pelo saber e trabalha a conscientização do aluno.
ALUNO: além de ser orientado pelo professor, também busca o autoaprendizado. O ensino parte de seu contexto e de temas que lhe são familiares.
AVALIAÇÃO: é feita com a participação dos diferentes sujeitos, tem a função de orientar a prática e acontece de forma continuada.
CARTILHAS: são consideradas inadequadas, pois o conhecimento é apresentado de uma forma distante da realidade das crianças.
AMBIENTE: a organização da sala de aula deve facilitar o diálogo entre as crianças e o professor.